Adoro coisas do Rio Antigo e costumo pesquisar curiosidades sobre a Zona Sul e adjacências, que foi onde passei minha infância e minha adolescência, especialmente nas áreas de Ipanema, Leblon e Lagoa.
Numa recente pesquisa para encontrar onde era o Morro de São Clemente <https://www.facebook.com/groups/memoriacarioca/permalink/4068824949825393/> — que lhe adianto logo que é o atual Morro Dona Marta — deparei-me com esta obra:
“Cidade de São Sebastião de Rio de Janeiro — Terras e Fatos”, de Aureliano Restier Gonçalves, uma edição comemorativa dos 110 anos do Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro — https://pt.scribd.com/document/216355050/Sao-Sebast-Rj-Terras-Fatos
À página 73, encontrei este trecho:
“O engenho do Rodrigo de Freitas, que compreendia também a lagoa, ocupava toda a região desde o antigo forte de São Clemente até o morro dos Dois Irmãos e desde a praia até as vertentes, como assinala a planta do capitão Cony...
..., a qual serviu de base para as medições de 1844 e de 1868. Foreiras à municipalidade, à razão de seis mil réis anuais, as terras foram remidas pelo governo do Império, por cinqüenta apólices da dívida pública de um conto de réis cada uma. Lavrou-se a respectiva escritura, a 18 de dezembro de 1869, na forma do artigo 14, da lei 1245, de 22 de junho de 1865. Logo depois do precitado decreto real da desapropriação, uma fábrica de pólvora e uma grande oficina de armas foram instaladas nos antigos edifícios dos Rodrigos de Freitas.
É interessante saber que, em 1932, o Conselho Florestal do Distrito Federal teve a triste idéia de propor à Prefeitura, pelo ofício 729 de maio daquele ano, a mudança do nome da lagoa – “por não ter significação histórica” [sic] para o de lagoa das Garças. Felizmente, a Diretoria de Matas e Jardins, manifestou-se contrária à absurda proposta.Em tempos antigos, longa era a caminhada para ir à então lagoa de Socopenapan. Partia-se de Botafogo e contornava-se o morro do Secretário para alcançar um estreito caminho, que era bem alagado em alguns pontos e tinha o mesmo seguimento das atuais ruas da Passagem e General Polidoro. Posteriormente, com as retificações e arruamentos que se fizeram, o trajeto passou a ser feito pelo Caminho do Carro – hoje rua São Clemente.Pescadores já habitavam em derredor da lagoa de Socopenapan no começo do século XVII. Foram eles os primeiros a praticar, periodicamente, a abertura de um canal de ligação do mar com a lagoa, para facilitar a entrada do peixe na época da desova, feita, como se sabe, nos remansos seguros da costa. Nesse trabalho de quase dois séculos e sem outra preocupação senão a de favorecer a sua indústria, os pescadores iam reduzindo os ares malignos que as águas mortas da lagoa espalhavam. Por fim, houve o despovoamento em conseqüência das febres pestilentas que assolaram a pitoresca região, sob a forma epidêmica grave. A de 1779 foi horrível, porque matava ou inutilizava pela paralisia. Desde então, pouco se cuidou da famosa lagoa. As algas cobriram-na e a morte a rodeou. Em 1837, fizeram-se ligeiros trabalhos de saneamento e nessa ocasião começou o corte da lendária 𝐏𝐞𝐝𝐫𝐚 𝐒𝐚𝐧𝐭𝐚 que se erguia muito inclinada sobre a estrada à margem da lagoa. O corte esteve a cargo do padre Manoel Gomes Souto, por empreitada. Ao fim de dois anos, o empreiteiro pediu à Ilustríssima Câmara um auxílio em dinheiro, alegando já ter gasto mais de 10 barris de pólvora e também muito maior importância do que a do seu contrato, que era de duzentos mil réis. A Câmara negou o auxílio e administrativamente terminou o serviço.Em 1880, o barão de Teffé, então capitão de mar e guerra e diretor da Repartição Hidrográfica da Marinha, apresentou estudo e plano ao Ministério do Império, que os solicitara, a respeito de obras para um saneamento definitivo da lagoa. Todo o trabalho do ilustre engenheiro naval, que faleceu com mais de 90 anos no posto de almirante reformado, aparece claramente desenvolvido em relatório seu, de 27 de fevereiro de 1880. Acompanha o relatório uma curiosa planta das margens da lagoa, levantada por Teffé com a colaboração do então capitão-tenente Francisco Calheiros da Graça, que também morreu idoso e almirante. Em 1883 e em 1887, novas tentativas e outros planos para o saneamento da lagoa, com o contrato de J. Belissine & C.º Nada se fez e os anos rolaram sobre esses e outros muitos fatos em relação à lagoa Rodrigo de Freitas. Por ela, realmente se interessou, quando prefeito (1920/1922), Carlos César de Oliveira Sampaio, um dos mais brilhantes administradores do Rio de Janeiro, pela sua operosidade surpreendente, aliada à sua alta competência de engenheiro e de intelectual, no que deu provas em muitas das suas realizações. Citaremos as obras da lagoa Rodrigo de Freitas, planeadas por técnicos da escolha de Carlos Sampaio e plano que obedeceu, em linhas gerais, idéias do precitado ilustre prefeito. Assim, cuidando ele da questão capital, que era o saneamento da lagoa, não descurou, todavia, da parte estética, e, sem quebrar os encantos naturais daquele recanto, transformou-o de forma a torná-lo uma das maravilhas da capital do Brasil”.
Quando li a menção à tal Pedra Santa já fiquei doido para saber onde ela ficava. E destaco o trecho de interesse:
“Em 1837, fizeram-se ligeiros trabalhos de saneamento e nessa ocasião começou o corte da lendária 𝐏𝐞𝐝𝐫𝐚 𝐒𝐚𝐧𝐭𝐚 que se erguia muito inclinada sobre a estrada à margem da lagoa.”
Para minha sorte — pensei eu — a resposta à charada estava na página 367 do mesmo documento, onde se lê:
“PEDRA SANTA — Lagoa. Originalmente localizada no antigo morro do Bahiano (parcialmente arrasado), existente na lagoa Rodrigo de Freitas, em sua saída para o mar, do lado do atual bairro do Leblon.”
Mas... Ué? O morro do Bahiano é aquele logo aos fundos do Conjunto dos Jornalistas, onde morei quando garoto, à Av. Ataulfo de Paiva, 50, no Leblon. É a velha “pedreira”, sobre a qual foi construído o atual Shopping Leblon. Então a Pedra Santa ficava próxima ao morro do Bahiano? Epa. Melhor checar.
Fui então ao site oficial do Jardim Botânico do Rio de Janeiro e consultei o maravilhoso arquivo de imagens, um rico acervo iconográfico compilado em dezembro de 2007 e restrito ao século XIX, contendo imagens publicadas em livros com os devidos créditos:
Na tabela que consta nessa página, as imagens 7 e 11 mostram a Pedra Santa:
As duas ilustrações demonstram que a referida pedra não poderia estar junto ao morro do Bahiano, quase bem perto da margem do atual canal do Jardim de Alah.
Conclusão: Um local provável, a julgar pelas figuras, seria bem à margem da Lagoa, mais ou menos em frente à Sede Náutica do Clube de Regatas Vasco da Gama:
Mais detalhes sobre a Pedra Santa neste delicioso artigo de Jorge Salles, no site da “Revista Enigmas”:
E se quiser um verdadeiro banho de história da Lagoa, aqui está:
- https://www.scielo.br/pdf/rod/v35n57/2175-7860-rod-35-57-0051.pdf
- http://www.arqueologia-iab.com.br/portfolios/view/16
Livro dos meus sonhos:
"A Fazenda Nacional Da Lagoa Rodrigo De Freitas", de Carlos Eduardo Barata e Cláudia Braga Gaspar.
ISBN-10 : 8564892278
ISBN-13 : 978-8564892279
Editora : Cassara (1 janeiro 2015)
Parabéns pela pesquisa sobre a cidade que de tão maltratada que precisa que estudemos as cicatrizes que restaram do progresso arrasador.
ResponderExcluirMuito obrigado por suas gentis palavras, meu caro Alcides. Um abração.
Excluir